Saiba tudo sobre cultura ágil pelos experts da dti.

Ouça e acompanhe nas plataformas abaixo.

SoundCloud
Spotify
iTunes

Marcelo Szuster: Olá, pessoal. Bom dia, boa tarde, boa noite. Aqui quem fala é Marcelo Szuster. Vamos começar mais um episódio Os Agilistas. Hoje eu estou aqui com Vinícius – Vinição – que é o diretor de operações lá da DTI. [00:00:14]

Vinícius Paiva: E aí, pessoal. Tudo bom? [00:00:16]

Marcelo Szuster: Então, hoje a gente tem um objetivo aqui que é tentar explorar mais um tema que permeia todos os nossos episódios até então. Se a gente parar para pensar, quase todo episódio nosso, de uma forma ou de outra, a gente cita que – dado que nós estamos enfrentando um ambiente muito instável, um ambiente onde a gente não consegue saber o que está acontecendo, a gente não consegue saber como se comportar – tem que mudar, radicalmente, a forma como a organização atua. Esse ambiente tem recebido o nome de V.U.C.A e a gente tem chamado de outras coisas, mas existe uma teoria sobre a qual a gente quer falar hoje que explica muito bem que ambiente é esse e a forma que você deveria agir nesse ambiente. Na verdade, existe uma teoria que define vários tipos de ambientes diferentes e mostra que você tem que agir de forma diferente para cada ambiente desses. Então, para ficar mais claro, o que nós vamos falar hoje aqui é sobre uma teoria que se chama Cynefin. Um modelo, na verdade, que se chama Cynefin. De um… não sei se o cara é filósofo, não sei o que ele é. Um erudito que trabalhou na IBM e depois… ele trabalhava com gestão de conhecimento e ele elaborou toda uma teoria, ele elaborou esse modelo que está ganhando cada vez mais notoriedade. Que se escreve Cynefin, mas fala Cainévim. Não é isso, Vinícius? [00:01:44]

Vinícius Paiva: Isso, cainévim. É o David Snowden. [00:01:45]

Marcelo Szuster: É o Da… e aqui acabou que eu esqueci mesmo. É o David Snowden. E o David Snowden, ele criou esse modelo para tentar explicar como as organizações devem lidar com os diferentes tipos de problemas. Então, esse modelo, na verdade, o Snowden, ele parte de uma coisa que eu acho bem interessante. Ele fala o seguinte – olha o modelo dele gente é como se fossem quatro quadrantes, só que eles não gostam que chamem de quadrantes … [00:02:12]

Vinícius Paiva: É, eu já ia falar isso aqui. [00:02:14]

Marcelo Szuster: (inint) [00:02:15] até olhou. [00:02:16]

Vinícius Paiva: Ele ia ficar bravo aqui. [00:02:17]

Marcelo Szuster: Eu e Vinição, a gente fez um curso de complexidade. E uma hora lá eu fui chamar de quadrantes e o cara quase me matou. Porque, na verdade, são regiões. E no meio, não são quatro retas que se cruzam. No meio você… porque existem umas regiões ali intermediárias, sabe. É um negócio bem … até para dar essa noção de orgânico, de transições. [00:02:39]

Vinícius Paiva: É, as transições são diferentes entre os domínios. A transição de um domínio para o outro pode ser diferente dependendo do domínio que tiver… [00:02:49]

Marcelo Szuster: É, exatamente. Esse caminho não é linear de um domínio para o outro. Mas assim, para você tentarem montar uma figura aí na cabeça, imaginem aqueles modelos de quadrantes famosos das consultorias. E a gente pode imaginar o seguinte, à direita, é como se a gente tivesse uma grande região que é a região daquilo que está ordenando, daquilo que tem ordem. E é interessante porque a primeira coisa que a gente pode começar a pensar é a seguinte, o ser humano é – tem até um artigo do Snowden, que ele fala isso – “o ser humano é um dos únicos seres capazes de impor ordem à natureza”. E a gente então costuma pensar sempre a partir dessa perspectiva de que há ordem. O Vinícius disse até que tinha um exemplo interessante lá do homo sapiens. Não é, Vinícius? [00:03:40]

Vinícius Paiva: É, tem um exemplo que eu cito as vezes quando eu estou fazendo os (ignitions) [00:03:43] da DTI ou palestras e tal. Que o ser humano, as sociedades começaram a se apaixonar demais por ordem. Principalmente após a revolução agrícola, mais ou menos 10 mil anos atrás. Antes disso, a gente era uma sociedade de caçadores-coletores e essa sociedade é um pouco mais versátil a ponto de conseguir conviver melhor com o mundo mais desordenado – vamos dizer assim. Então se, por exemplo, a gente fizesse parte de uma pequena tribo – nessa sociedade de caçadores-coletores – e a gente estivesse em uma tragédia, por exemplo uma enchente, a gente conseguiria lidar muito melhor com isso do que numa sociedade pós revolução agrícola. Até porque a gente tinha menos propriedade privada ou quase não tinha. O (inint) [00:04:39] gosta de falar que uma casa da sociedade agrícola tinha mais itens, mais utensílios do que uma tribo inteira de caçadores-coletores. Então, se tivesse uma e enchente – alguma coisa assim – o ser humano… essa tribo era muito mais versátil e conseguia, vamos dizer assim, mudar para uma outra região de forma mais fácil. Já estava acostumada a fazer isso, ela já esperava a desordem de forma mais natural e mais comum. Depois da revolução agrícola, o ser humano começou a se preocupar muito com a propriedade que ele tem. Porque ele começou a ficar mais frágil, até pelo fato de não conseguir lidar muito bem com a desordem. Então imagina assim, uma plantação inteira, se tivesse uma enchente, ela seria exterminada e isso exterminaria, provavelmente, com uma vila inteira. Porque dependia daquilo ali. E o ser humano começou a não ter mais tanta facilidade para lidar com esses eventos de desordem. Então acho que, igual ele fala, nesse momento começou a ter uma paixão um pouco maior pela necessidade de ordem. [00:05:51]

Marcelo Szuster: Então, interessante. O pessoal vai entender daqui a pouco onde a gente quer chegar. É bem interessante, ou seja, o ser humano sai de um estado primitivo onde ele estava em ambiente no qual ele não conseguia prever as coisas, ele tinha que se adaptar. E ele começa a criar ferramentas, criar instrumentos, controlar a natureza, plantar, controlar a vila, fazer diques, armazenar água e colocar ordem… [00:06:18]

Vinícius Paiva: Domesticar animais, domesticar plantas. [00:06:19]

Marcelo Szuster: …é domesticar animal. Ou seja, ele começa a, efetivamente, mudar a realidade para que ela seja uma realidade ordenada. E uma realidade bem-ordenada, não sei se você concorda, ela tem a ver com ter relações de causa e efeito bem claras. [00:06:35]

Vinícius Paiva: Isso. [00:06:36]

Marcelo Szuster: Não é isso?… [00:06:37]

Vinícius Paiva: É. [00:06:37]

Marcelo Szuster: Você começa a ter relações de causa e efeito bem claras. [00:06:41]

Vinícius Paiva: Você começa a conseguir ter um pouco mais de previsibilidade. [00:06:44]

Marcelo Szuster: É, e aí você imagina, na medida que isso foi evoluindo – até chegar na revolução industrial e chegar até onde a gente está hoje em dia – é como se fosse a expressão máxima dessa ordem dentro das próprias empresas e organizações que foram criadas para serem essas máquinas de produzir o que quer que fosse necessário ser produzido. Então assim, basicamente, o que o Snowden tenta mostrar é que a gente opera muito a partir da perspectiva desse lado onde as coisas têm ordem. Ou seja, onde as coisas têm relação de causa e efeito muito claras. E mesmo dentro desse lado, ele mostra que tem ainda dois tipos – assim vamos dizer – de problemas. Tem uns problemas desse lado que são classificados como óbvios. E o que significa? São problemas que basta você categorizar o que está acontecendo que você já sabe o que você tem que fazer. Está certo? Então, imagina uma situação – mais oba que eu consigo pensar – é uma lâmpada queimada por exemplo. Você fala assim: “ah, aquela lâmpada está queimada”. Eu categorizei o problema, a lâmpada queimou. E o que eu tenho que fazer é, simplesmente, trocar aquela lâmpada. Então, eu não tenho nem que pensar nem fazer nenhum tipo de análise. Eu tenho catalogado aquilo e eu respondo aquilo imediatamente. [00:08:09]

Vinícius Paiva: É, o Snowden… [00:08:10]

Marcelo Szuster: Você tem outros exemplos, Vinícius? [00:08:11]

Vinícius Paiva: É, assim, eu dou um exemplo também do Snowden. O Snowden, ele gosta de dar o exemplo do trânsito. Se você chega no trânsito, você não fica pensando assim: “ah… agora como eu vou fazer?” Você não tem como analisar muito, é mais categorização. Tipo assim, se eu estou no Brasil, então eu vou ficar à direita e pronto. É uma categorização simples. [00:08:28]

Marcelo Szuster: Se a luz do sinal está vermelha, eu paro o carro. [00:08:30]

Vinícius Paiva: É, você deu um bom exemplo também. Um sinal de trânsito é um sistema altamente ordenado. Muito ordenado e com regras muito simples. A questão do óbvio igual você falou, tem a ver também com o número pequeno de regras e de elementos. Você vai falar mais para a frente quando começar a aumentar isso e a gente cair em uma outra categoria. No mundo de uma empresa, normalmente esse tipo de problema você consegue atuar bem também. As vezes utilizando checklist. Muitas vezes você vai fazer, vamos supor, um teste de uma história de software. Você vai entregar uma tela, alguma coisa assim de filtro. Então você vai testar, por exemplo, vai ter um checklist lá que você vai ter que verificar se o foco está no campo para o usuário não ter que ir lá com o mouse e colar lá. Isso não é uma coisa que você tem que ficar fazendo muita análise. Simplesmente se você seguir um checklist, provavelmente, você vai conseguir eliminar esses defeitos bobos do software. [00:09:32]

Marcelo Szuster: Então, caminhando nesse aspecto do mundo ordenado, obviamente que nem tudo é óbvio ou simples assim. E começa a ter uma outra natureza de problemas que são aqueles que caem no aspecto, que a gente entende como, complicado. E as vezes, usa a palavra complicado e complexo de forma intercambiável. Mas aqui, a gente queria deixar bem claro que, nós vamos usar o complexo com uma definição diferente do que seria o complicado. Então, assim, o compli… [00:09:59]

Vinícius Paiva: Na literatura, inclusive, o pessoal brinca que as vezes é difícil explicar as coisas porque no dia a dia isso é um termo de uso comum. Do tipo assim: “Ah esse negócio é difícil”. Então é complicado, é complexo…[00:10:14]

Marcelo Szuster: Tipo sinônimo, não é? [00:10:15]

Vinícius Paiva: É, a definição aqui é um pouco diferente. [00:10:16]

Marcelo Szuster: É, na teoria de sistemas não é sinônimo. Não é? [00:10:20]

Vinícius Paiva: Exatamente. [00:10:20]

Marcelo Szuster: Mas na linguagem comum é. E, assim, o complicado é o que? A definição de complicado é algo que, para ser resolvido, requer mais raciocínio analítico, requer mais (inint) [00:10:33]. São problemas, igual o Vinícius falou, que tem mais elementos ali. Que tem mais interações entre si, mas que ainda tem relações de causa e efeito bem estabelecidas a priori. Se você conseguir entender bem o que está acontecendo ali., você consegue solucionar aquela situação. [00:10:52]

Vinícius Paiva: É uma… você até falou que essas conexões são bem definidas. Eu gosto de usar o termo, que são conexões bem rígidas. Conexões que elas não vão ficar… elas não são soft, vamos dizer assim. Elas não vão ficar mudando, a não ser que tenha algum evento externo meio diferente. Então, essas ligações tornam o sistema de alguma forma previsível. Igual você falou, como uma relação de causa e efeito que, no caso do óbvio é meio que… é obvio. Você consegue perceber de forma bem fácil, sem ficar explicando muito. No caso do complicado, você precisa de especialistas. Mas com um determinado tempo, grande ou relevante de estudo, ele vai conseguir entender qual é aquela ordem, como são aquelas ligações, qual é a relação de um elemento com o outro. O número de ligações não é uma hiperconexão igual seria um sistema complexo. [00:11:47]

Marcelo Szuster: Então, isso é bem interessante gente. Eu acho que a gente tinha que salientar muito bem esse ponto, porque o grande problema – na minha visão – que existe para as organizações mudarem efetivamente é quebrar esse paradigma de que o problema vai, no máximo, ficar complicado. Sabe, é tipo assim, na verdade, a gente só começa a achar… vamos só para não nos perdermos aqui, vamos pensar nessa região do Snowden de ordem. A gente sai de uma coisa tão simples quanto algo que é categorizável e pronto, até uma coisa que é supercomplicada e que vai requerer uma senioridade muito grande. Porque alguém vai ter que usar a experiência dele, a capacidade analítica, interagir com outros especialistas para dar determinadas soluções. Só um comentário, não é Vinícius, que a gente esqueceu de falar. Nessa região aí, o que o Snowden defende, é que ao contrário da ordem onde você tinha a melhor prática, nessa você não tem a melhor prática, você tem uma boa prática. Porque… [00:12:48]

Vinícius Paiva: Você tem boas práticas. [00:12:50]

Marcelo Szuster: É, você tem boas práticas porque, assim, ele dá um exemplo de aviação. Uma empresa que constrói avião pode fazer uma coisa de um jeito, uma outra pode fazer de um outro jeito – fruto da experiencia dos especialistas ali, de cada uma – e dificilmente você vai poder falar exatamente que ali. Tem uma melhor prática. [00:13:08]

Vinícius Paiva: sim. [00:13:08]

Marcelo Szuster: São tipo de soluções diferentes para o mesmo problema bastante complicado. Mas qual que eu acho que é o X da questão aqui? E que talvez seja a principal reflexão que a gente quer trazer hoje aqui e quer explorar muito daqui para frente. O X da questão é que as organizações, as pessoas, a forma como a gente foi criado, a forma o líder age é como se a gente achasse que só existe essa região. E que o máximo que acontece com um problema é ele só muito, muito complicado. [00:13:41]

Vinícius Paiva: É, e aí nesse caso, basta você normalmente colocar a senioridade. Não é? [00:13:45]

Marcelo Szuster: É, exatamente assim… [00:13:46]

Vinícius Paiva: A solução para isso é senioridade, é você… como se o sistema tem uma relação ali de causa e efeito clara, basta você planejar muito bem antes, basta você estudar muito bem o problema antes que você sairá do outro lado. Vai conseguir resolver o problema. [00:14:04]

Marcelo Szuster: É, então. Olha que interessante. A solução no fundo, é fazer o que a gente vê que predominou no século XX ou o que predomina nas organizações. A solução no fundo é o que? A solução é planejar para caramba o que vai ser feito, é meticulosamente tentar entender, analisar, gastar muito tempo analisando aquele problema. E isso não está errado, se você parte de um paradigma em que você realmente acredita, que você consegue estabelecer essas relações de causa e efeito a priori, consegue – digamos assim – desvendar aquele problema. É esse negócio de ser curioso. [00:14:39]

Vinícius Paiva: Exatamente. [00:14:39]

Marcelo Szuster: É como se você realmente fala assim: “cara”… [00:14:40]

Vinícius Paiva: Se você estudar muito bem ele, ficar estudando ali durante muito tempo. Você entenderá quais são as relações de causa e efeito e você vai conseguir apertar o parafuso no lugar certinho ali. [00:14:51]

Marcelo Szuster: Exatamente. Aí que vem o grande X da questão. Por que? Para o Snowden – além de que não é só para o Snowden obviamente, não é gente, ele deve ter feito uma síntese de um tanto de teoria aí – mas pegando… [00:15:02]

Vinícius Paiva: A gente está usando ele como referência, não significa que não tenha outras literaturas. [00:15:06]

Marcelo Szuster: …pegando o modelo do Snowden, o que ele mostra é o seguinte: olha, tem uma outra região – que eu não lembro se é a de desordem ou unorder, sabe, em inglês – mas é uma região onde você não tem a ordem. E aí nessa região, você tem a região da complexidade: a sub-região – digamos assim, da complexidade – e a sub-região do caos. A complexidade, o que acontece, não é? A palavra complexo ela significa, na sua origem lá, aquilo que está tecido junto. Então assim, na complexidade, nesses problemas que caem no mundo complexo, ao contrário do que o Vinícius disse lá anteriormente, que no complicado você tem muitas conexões, mas elas são hard. Aqui você tem muitas conexões, mas elas podem mudar. Os elementos que estão formando aquelas conexões, eles podem mudar também. Então aquele sistema é muito mais adaptativo, porque ele vai mudando em função do que acontece com ele mesmo. [00:16:05]

Vinícius Paiva: É, além de… você falou que são muitas conexões, normalmente, uma diferença que existe é um hiperconexão. Uma ordem de grandeza superior. Mesmo o sistema complicado, que tenha muitas conexões, o sistema complexo normalmente é um sistema hiperconectado. [00:16:22]

Marcelo Szuster: É, está tudo conectado com tudo praticamente. E tudo influenciando tudo. E aí… [00:16:28]

Vinícius Paiva: E ainda com regras que não são tão rígidas. [00:16:31]

Marcelo Szuster: É, e aí… [00:16:32]

Vinícius Paiva: De vez em quando você segue uma regra, de vez em quando você não segue aquela regra. [00:16:35]

Marcelo Szuster: …não, e aí é curioso por quê? – Só para dar mais exemplos antes de entrar, por que isso afeta tanto as organizações – Você pega, sei lá, um formigueiro. É um bom exemplo de um sistema complexo porque você tem interações ali entre os elementos, interações supersimples – olha que nós estamos falando aqui de formiga e depois nós vamos falar da diferença da formiga para o ser humano – mas você tem interações ali supersimples, que levam a comportamentos emergentes que são completamente… que só existem devido a interação entre milhares daqueles pequenos elementos que estão reagindo localmente a regras muito simples. Então, se você parar para pensar que um formigueiro entra em guerra com outro formigueiro, ele se move, dentro do formigueiro as formigas constroem cemitério para poder…[00:17:25]

Vinícius Paiva: Você constrói trilhas…[00:17:27]

Marcelo Szuster: É, constrói trilha… [00:17:27]

Vinícius Paiva: Para explorar uma região… [00:17:30]

Marcelo Szuster: Elas fazem ponte, já viu isso? As formiguinhas, elas começam a fazer umas pontezinhas – sobem umas nas outras e fazem pontes. E tudo isso, a partir somente da interação local que acontece a partir de pequenas regras. Agora, imagina o seguinte, se essas interações locais dão origem a um comportamento tão complexo – porque assim, gente, só para conectar com o outro exemplo – na região ali do complicado, você vai vendo as interações entre as partezinhas e consegue prever melhor o que é aquele todo, as relações de causa e consequência e etc. Aqui, como você vai olhar para duas formiguinhas interagindo e vai imaginar que aquilo ali. Elas estão interagindo de forma que daqui a pouco aquilo ali vai formar um formigueiro. [00:18:16]

Vinícius Paiva: É como se na região ali do complicado, o comportamento do sistema tivesse um pouco mais a ver com a soma das partes. No caso do sistema complexo, o comportamento não necessariamente…[00:18:30]

Marcelo Szuster: É maior que a soma das partes. É aquela frase famosa. [00:18:33]

Vinícius Paiva: …é maior que a soma das partes. É, ela é diferente. E realmente é diferente. [00:18:35]

Marcelo Szuster: É, exatamente. A característica fica sendo do sistema. Uma coisa, uma característica… [00:18:39]

Vinícius Paiva: É, uma característica bem importante. A característica não é de uma parte que junto com a outra é… aí tem uma outra característica que somada a uma outra é… é uma característica que emerge disso aí, dessa interação entre as partes e é uma característica do sistema. Se você não tiver uma visão do sistema – por isso que o pessoal fala: “ah, você não tem visão sistêmica”, porque você não consegue, você fica olhando só para as partes e tenta inferir o comportamento do todo. Sendo que o comportamento do todo, ele não tem a ver só com as partes, mas também com a interação entre as partes. [00:19:08]

Marcelo Szuster: Agora, que interessante, é um exemplo – que eu falo até as vezes para as pessoas que eu converso na DTI – se a gente está falando de formiguinha interagindo via feromônio, sem ambiguidade, sei lá… ela não… uma formiguinha, quando ela vê um feromônio a trilha, ela não pensa assim: “Será que alguém botou esse feromônio aqui? Por qual motivo? O que queria? Por que botaram esse feromônio aqui?” Estou querendo dizer o seguinte, quando a gente pega os sistemas humanos, os sistemas sociais, você adiciona – além de você ter essa hiperconectividade que o Vinícius comentou – você relaciona um outro grau que muda, que torna o sistema mais difícil de prevê ainda que é a interpretação subjetiva de cada um sobre a realidade. Isso é muito colocado pelo Snowden. Ou seja, o ser humano tem essa interpretação subjetiva. Então, os sistemas que envolvem os seres humanos, eles são ainda mais complexos nas interações… [00:20:01]

Vinícius Paiva: É. A ordem de grandeza e de complexidade é muito maior. [00:20:04]

Marcelo Szuster: É porque você adicionou, como se fosse, mais uma dimensão ali. [00:20:06]

Vinícius Paiva: É. As regras, de caras, são mais soft ainda. Porque você tem alguém pensando ali e nesse pensando ele vai interpretar a regra de um jeito diferente, em um contexto diferente. Quando você tem mais pessoas, mais ainda. Esse nível de ambiguidade normalmente aumenta muito. [00:20:22]

Marcelo Szuster: Então e aí, para tentar garantir que nós estamos sendo claros aqui. Então imaginem só que acontece, é… quando a gente começa a ter um mundo que é mais complexo, o que a gente está querendo dizer no final das contas? Que hoje, como está todo mundo extremamente muito mais conectado – porque imagina assim, é… se a gente pegar… porque a gente sempre fica falando de economia do Século XX ou economia atual – digamos assim, no Século XX as pessoas estavam muito mais desconectadas, elas influenciavam muito menos umas às outras. E eu estou pensando nas empresas tentando oferecer serviços para os consumidores. Hoje está todo mundo extremamente conectado, todo mundo influenciando todo mundo e tudo evoluindo extremamente rápido. E a gente começa a pensar o seguinte, será que uma empresa que está atuando nesse ambiente oferecendo um determinado tipo de serviço – oferecendo um determinado tipo de produto – ela consegue acreditar que uma simples capacidade analítica, pessoas extremamente experientes, extremamente inteligente vão conseguir prever as relações ou o que vai acontecer dentro desse mundo? [00:21:38]

Vinícius Paiva: É, meio, é meio… eu gosto de um exemplo que tem no – não é um exemplo interno, você estava falando, não é da parte interna das empresas – mas eu gosto de um exemplo externo que reflete na parte interna também. Tem um exemplo no livro (science risk human) [00:21:53] que tem tudo a ver com o que a gente está falando aqui. É…eles falam assim: A Amazon é, normalmente, muito citada pelo pioneirismo de enxergar o mundo assim. De enxergar o mundo desse jeito onde você tem que colocar as coisas a prova para poder ver o que emerge em relação ao comportamento do produto que ela está lançando. Então, ela entendeu que não dá para ter esse nível de previsibilidade de um sistema muito ordenado. Ela entendeu que o mundo opera de uma forma muito mais complexa, então tem que agir com ferramenta e formas de trabalhar assim. Então ela sempre utilizou muito essa técnica do (science responder) [00:22:31]. O próprio Snowden, ele fala quando você está nessa região você tem que fazer muita experimentação e fazer o (sense and responder) [00:22:40], ou seja, você lança alguma coisa, avalia o que está acontecendo ali e responde como ação de correção de rumo com relação a aquilo ali. Mas, em uma das vezes que ele tentou, é… a Amazon, mais especificamente o Jeff Bezos, começou a gostar demais ali. do poder e começou a se enxergar, como um igual (inint) [00:23:04] fala, como um mestre de xadrez que enxerga tudo. Então ele começou a achar tipo assim, que ele estava tão poderoso que ele conseguiria enxergar a ordem do mundo. Então ele fez um lançamento, na verdade um lançamento não. Um investimento inteiro no (Finder Fire) [00:23:17]. Eu fui uma das vítimas do Fire, eu comprei um Fire. Acredita? É… então ele não fez um (Sense Responder)[00:23:26]. Ele não colocou isso a prova para ver que comportamento emergente das hipóteses que ele tinha em relação ao produto. Nesse caso, foi uma falha retumbante. Um investimento de bilhões de dólares foi jogado fora. Eu gosto de dar esse exemplo porque ele ilustra bem essa… quando você enxerga o mundo de forma, igual você falou, na ontologia errada você pode ter um comportamento bem catastrófico. [00:23:48]

Marcelo Szuster: Então, isso que eu acho interessante que eu queria ressaltar bastante aqui. Alguém pode estar pensando: “Poxa, mas você já fala em todo episódio que tem de fazer experimentação”. E ao (inint) [00:24:00], significa isso. Que a gente está querendo mostrar o que está por trás disso. Porque eu sinceramente, eu acredito profundamente que na verdade as lideranças, muitas lideranças elas não acreditam exatamente nisso. Porque é difícil para a gente, é difícil para a gente acreditar o seguinte: não é possível; principalmente para quem é inteligente, para quem está no topo, para quem teve um carreiro que ele acredita que ele chegou ali pelos méritos próprios e porque ele é muito inteligente, e porque ele tem um raciocínio analítico brilhante e porque ele usou uma série de ferramentas tradicionais de planejamento estratégico e etc. É quase impossível esse cara no fundo, no fundo eu acho mesmo sabe, que o cara pensa assim: cara, isso é papo furado. É claro que se eu usar a minha inteligência aqui, eu consigo saber o que vai acontecer. [00:24:50]

Vinícius Paiva: Em um cenário desse, que você acabou de falar, a própria questão de meritocracia dá para se questionar um pouco. Já que o comportamento emerge do (team) [00:24:59], e não necessariamente de uma pessoa específica. [00:25:02]

Marcelo Szuster: É, isso aí é tão polêmico que… [00:25:07]

Vinícius Paiva: Isso aí dá um episódio. [00:25:08]

Marcelo Szuster: É, porque a premiação das empresas é individual. Tem empresa que não acredita nisso de jeito nenhum. Tem muita sorte na jogada. O que não quer dizer que cada pessoa não tem que fazer um esforço danado e etc. A questão é o tanto que a contribuição é daquela pessoa sozinha mesmo. O quanto que aquele indivíduo sozinho fez aquilo. Mas assim, o que eu queria voltar a salientar aqui é isso. Então, é como se fosse o seguinte: a primeira coisa que eu tenho que fazer para saber como eu ajo, eu tenho que saber que tipo de problema com o qual eu estou lidando. No final das contas, esse modelo serve só para provar isso. Então obviamente que se eu tenho um problema que está na região da ordem, eu vou usar. Ou a categorização ou o raciocínio analítico e é claro que eu tenho que fazer que aquilo. Agora… [00:25:55]

Vinícius Paiva: E assim, uma grande dificuldade está exatamente – igual você falou – os problemas são muito emaranhados. No meio de um problema pode ter uma parte do problema que é tipo uma gestão de rotina, vamos dizer assim. E você no domínio ali do óbvio ou do complicado. Então se você seguir um checklist, se você tiver bons analistas de determinados assuntos você vai sair do outro lado. Então, a grande inteligência está em realmente perceber – no conjunto de problemas que você está ali – e fazer uma separação de que região, de que domínio você está operando ali naquele caso. [00:26:31]

Marcelo Szuster: É, exatamente. Porque a empresa vai operar o tempo todo em todas as regiões e vai ficar pulando de uma região para outra, mas se ela não perceber que tem certos problemas que são dessa natureza – esses problemas são até, não vou dizer que são facilmente identificáveis não, mas hoje tem muitos indícios muito forte… a própria mudança organizacional é claramente um problema dessa natureza. Talvez seja o meio problema dessa natureza, eu diria assim. Eu não diria que é o maior. É meio forte a minha afirmação. Mas o que eu quero dizer é o seguinte – é um negócio muito engraçado e isso eu acho curioso demais, as vezes eu conversando com algum cliente, já falei isso aqui em outros episódios. E aí, como eu começo a mudança? Como eu faço a mudança? Aí eu brinco com o cara. Olha, poxa, você não vai tentar ser ágil fazendo planejamento waterfall detalhado de como você vai ser ágil. É… [00:27:26]

Vinícius Paiva: Meio estranho. [00:27:26]

Marcelo Szuster: É. Uma outra forma de enxergar isso. Isso é uma forma, uma outra forma de enxergar isso é explicar para o cara o seguinte: olha, suponha que você não acreditou quando eu te falo que você lançar um novo produto no mercado, por exemplo, ou ser capaz de se adaptar rapidamente ao mercado que isso é um problema complexo. No fundo você acredita que… [00:27:48]

Vinícius Paiva: Você consegue prever. Estudar bem isso aí, planejar bem isso não é. Ver o que vai acontecer. [00:27:53]

Marcelo Szuster: É, você consegue. Mas ainda assim você quer mudar um pouco a estrutura da sua organização, você mudar o comportamento das pessoas, quer que elas interajam de outra forma. Não é possível que esse problema você acha que é tão fácil de prever. Como é que essas pessoas vão se comportar no novo paradigma. [00:28:09]

Vinícius Paiva: É basicamente, assim, é uma regrinha que dá para se usar é quando você tem a interação de um conjunto de mais de três, quatro, cinco pessoas ali. Certamente, você tem uma tendência muito grande a cair em um problema complexo. [00:28:22]

Marcelo Szuster: É, não. E o que eu estou comentando é assim, pensa bem. Uma mudança organizacional, se um cara tem certezas e convicções sobre produtos que ele acha que vai ser lançado – que as pessoas vão reagir tais formas – acho que qualquer pessoa tem experiência o suficiente para saber que se você mudar uma organização, mudar a estrutura dela, mudar os incentivos, mudar a forma como as pessoas interagem que isso aí está longe de ser previsível. [00:28:47]

Vinícius Paiva: É, a gente estava comentando aqui antes. Por exemplo, um problema as vezes de fazer uma definição inicia de uma arquitetura. Talvez ele caia ali no domínio do complicado, embora tenha essas questões de arquitetura emergente; não vou entrar nesse mérito. Mas assim, o simples fato da adoção dessa arquitetura pelas pessoas já caí no problema complexo. Porque você tem interação entre as pessoas. [00:29:10]

Marcelo Szuster: É, ou seja, tudo o que envolve o ser humano ali tendo que alterar o comportamento dele vai acabar sendo um problema complexo. Então, eu estou falando isso por quê? O que a gente mais vê nas empresas hoje é uma outra forma de falar o que eu falei, de que não poder ser waterfall para você mudar a empresa. E por que eu estou salientando isso aqui bem, gente? Porque hoje, na verdade, eu acredito até que as empresas já entendem que elas têm que trabalhar diferente. Se não porque… eu ainda insisto que muitos, na minha visão, ainda acreditam que preveem o futuro inteiro. Mas eles precisam aumentar a velocidade de entrega. Então, eu realmente acredito que muitos líderes ainda vão atrás do ágil para acelerar uma entrega do que eles já sabem que tem de ser feito. Ele ainda mantém aquela convicção de que sabe o que tem que ser feito, mas uma coisa que eles sabem é que a empresa entrega devagar. Bota pouco Software no mercado. Então, quando vai atrás do ágil, vai essencialmente atrás de fazer entregas continuamente. E por que eu estou falando isso? Porque o que a gente mais observa nas empresas, apesar da gente está em 2019, o que a gente mais observa – e eu faço essa pergunta para quem tiver escutando, é o seguinte: qual foi a última vez que você pivotou no produto digital que você está desenvolvendo? E aí vai vir um silêncio, na minha opinião. Exceto, talvez as startups. Nas empresas grandes, mesmo as que estiverem adotando métodos ágeis, eu pergunto: qual foi a última vez que vocês pivotaram? Qual a última vez que você aprendeu alguma coisa durante o desenvolvimento do produto que fez mudar a concepção do produto? Então, por que eu estou falando isso? O ágil, hoje, vem muito para entregar velocidade. Ele não vem tanto para entregar aprendizado. Ele vem muito para entregar velocidade. Mas se a gente entender, na verdade, o modelo que está por trás de tudo; a gente tem que ir atrás é do aprendizado e de pivotar. [00:31:15]

Vinícius Paiva: É, e dentro do que surgiu, a raiz é muito mais o aprendizado mesmo. Realmente, uma interpretação errada do que é os princípios de agilidade. [00:31:30]

Marcelo Szuster: É, exatamente. Assim, eu acho esse insight importante mesmo. O ágil é usado só para ganhar velocidade. Eu tenho convicção que maior parte dos grandes executivos que querem ir para o ágil, eles vão atrás da velocidade. Porque como fiz general lá falou – do exemplo do grande mestre lá – a maior parte dos grandes executivos acredita saber todos os próximos passos. E agora ele pensa: “oba, vou acelerar esses próximos passos porque eu já estou pensando.” Por que então é tão importante entender a natureza do problema? Se começarmos a entender que o que a gente está operando, na verdade, é um ambiente complexo onde o próximo passo você não sabe bem qual é – ele vai emergir de experimentos que você tem. Você começa a entender que você tem que ter outros tipos de práticas. O Snowden mostra o seguinte, todas as ferramentas de consultoria estratégicas/tradicionais, todas ele faz – no artigo dele ele lista – todas caem nessa região do ordered. E elas…[00:32:30]

Vinícius Paiva: Não que não tenha valor. Mas ela tem valor para problemas que estão naquela região. [00:32:35]

Marcelo Szuster: É, exatamente. Perfeito. É claro que várias, poxa – aliás esses disclaimer aqui é importante – quem somos nós para falar que todo um corpo de conhecimento que existe aí não teria valor. A questão é: onde aplicar esse corpo de conhecimento? Então, assim, essas ferramentas – todas elas – é muito mais fácil se você empacotar e vender ferramentas que estão nesse aspecto do ordered. Isso é muito mais fácil de virar uma oferta para uma empresa de consultoria. [00:33:05]

Vinícius Paiva: Até porque é igual eu falei no início, a gente adora ordem. Quando você vê uma coisa que está mais no domínio do complexo, que o nível de ordem diminuiu, a ansiedade, a insegurança vai lá em cima. Então você fica meio tipo assim… o nosso comportamento vai emergir aqui. Nós que vamos ter que conhecer mais os fundamentos de tudo do nosso negócio e vamos ter que aprender o que a gente tem que fazer, como tem que fazer é bem angustiante. É bem desafiador. [00:33:34]

Marcelo Szuster: São questões existenciais. Então pessoal, caminhando aqui para o fechamento, eu acredito que foi bacana a conversa. Porque para mim a principal mensagem que emerge é essa, sabe. Você vê, aqui foi uma conversa complexa que emergiu a mensagem aqui. [00:33:51]

Vinícius Paiva: É, só…, só… acabou que a gente não falou. Não deu muita atenção, mas tem o domínio do caos. A gente acabou não falando. Mas já que a gente estava falando do Cynefin, tem que falar um pouquinho aqui. Mas o domínio do caos é onde você não tem conexões, as partes estão desconectadas. Então, é assim. Não vamos aprofundar aqui não, o foco era mais na complexidade. Mas só para não deixar de falar. [00:34:16]

Marcelo Szuster: É, no caos você age primeiro. É aquela história, no caos você age primeiro. Mas é isso aí pessoal, a mensagem que eu acho que é importante – que eu até brinquei que emergiu aqui – é essa de que é importante entender a ontologia do problema – como o Snowden fala – ou a natureza do problema para você saber que tipo de ferramental você usa. E aí, eu queria reforçar o que eu já disse aqui antes, agilismo não é só para dar velocidade. O agilismo é para você aprender e para você, realmente, ir se adaptando ao novo mundo. Você fazer parte desse sistema complexo adaptativo que é o mundo. Se você não entender essa ontologia direito, você nunca vai tirar proveito total do agilismo. É isso aí. [00:34:57]

Vinícius Paiva: Até mais.

: :
os agilistas

#20 Você não sabe o próximo passo

Saiba tudo sobre cultura ágil pelos experts da dti.

Ouça e acompanhe nas plataformas abaixo.

SoundCloud
Spotify
iTunes

Ficou com dúvidas?

contato@dtidigital.com.br
R. Antônio de Albuquerque, 330 – 14° andar
Savassi, Belo Horizonte – MG, 30112-010